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quarta-feira, 14 de março de 2012

‘O regime russo é fascista’

Putin foi acusado de manipular eleição presidencial
Durante 3 meses, a partir da fraude parlamentar no dia 4 de dezembro, todo o aparelho administrativo e burocrático, toda a artilharia pesada de redes de tevê, todo o dinheiro dos oligarcas russos – toda essa maquina de propaganda de Gebbels trabalhou 24 horas para colocar de novo no poder supremo a sua criatura – Vladimir Putin. Acabando a palhaçada com o “presidente interino” Dmitry Medvedev. Ele disse que deixaria seu cargo ao Putin e prometeu que iria trabalhar “como um escravo na galera”. O escravo, aliás, tem duas “galeras”, os luxuosos iates Оlimpia e Sirius, com valores de centenas de milhões de dólares. Um lhe foi presenteado por Roman Abramovitch, o magnata do petróleo, e o outra saiu do orçamento do Estado. Entre os países mais ou menos civilizados do mundo, somente na Rússia o poder não passa de uma pessoa para outra nas eleiçoes honestas. O poder é herdado, comprado, ou negociado. Em 24 de setembro, Medvedev concluiu negociações presidenciais e anunciou para todo o mundo que deixaria o cargo de presidente para Putin. Por sua vez, Medevedev preencheria a vaga de primeiro-ministro, segundo Putin. A “tandemocracia” russa foi uma desilusão completa para quem ainda achava que a Rússia também pode ter uma democracia verdadeira. Numa das piadas daqueles tempos, o vizinho idaga à vizinha: “Onde trabalha o seu filho?” E a vizinha: “Está em Moscou, trabalhando como presidente no escritorio de Putin”.

Na minha opinião, o Kremlin e a equipe putinista usou dois métodos para ganhar o jogo (nem quero dizer o “pleito”) presidencial. Primeiro, como sempre antes, foram utilizadas as tecnologias ditas “sujas”, ou melhor, brutais, e que nunca falharam ao longo dos últimos 20 anos de “democracia” na Rússia, a começar com Boris Yelltsin. Isso, vale exprimir, não diz respeito ao Mikhail Gorbatchev, eleito como primeiro e último presidente da União Soviética por votação com mãos erguidas, em 1989, pelo Congresso dos Deputados do Povo. As fraudes eleitorais começaram em 1992, tornaram-se cada vez mais sofisticados e mecanizadas com a ajuda do progresso tecnológico.

Quais os métodos “sujos” utilizados pelo Kremlin em 4 de março de 2012?

Primeiro método: fraudes eleitorais

1. Numerosas empresas declararam domingo de 4 de março feriado. Trouxeram até urnas de votação para o pessoal. As eleições ocorreram sob o permanente controle dos chefes, que orientavam os fucionários em quem votar.

2. Nas últimas horas do pleito, foram criadas seções eleitorais complementares. Nelas foi vetado o acesso de observadores não filiados ao partido no poder, Rússia Unida. Ninguém sabe como foi feita a contagem de votos nessas seções.

3. Houve votaçao “domiciliar”, bastante favorável a Putin. Representantes da comissão eleitoral levaram as chamadas “pastas de
Na maioria das vezes, as pessoas votaram em quem os integrantes da comissões eleitorais lhes indicavam, disse Vladimir Grigorenko, chefe da seçao eleitoral № 706, com sede na escola secundaria № 970 de Moscou. Foto: Slava Alekseyev
 votação” para casas de pessoas idosas, deficientes físicos e outras impossibilitadas de votar. Na maioria das vezes, essas pessoas votaram em quem os integrantes da comissões eleitorais lhes indicavam. Isso me confirmou o chefe da seçao eleitoral № 706, com sede na escola secundaria № 970 de Moscou, Vladimir Grigorenko. Ele disse que 90% desses infelizes preferem Putin porque quase não conhecem outros candidatos, e na tevê só aparece este personagem. Para eles, Putin já virou uma pessoa íntima, um parente que cuida da saúde e da vida deles. Para estas pessoas marginalizadas, perfê-lo sifnificaria romper o elo que as liga a uma “fabulosa” vida a reinar fora dos seus lares miseraveis. Segundo Grigorenko, de 6 milhoes de russos votam assim de suas casas, o que equivale ao rússo de votos que ganharam Vladimir Jirinovski e Serguei Mironov juntos.

4. A mais recente invenção da equipe de Putin chama-se “carrossel”. Ônibus traziam a Moscou de outras cidades “eleitores” pagos (uns 30 a 40 dolares), cada qual com um monte de cédulas de votação. Circulando por várias seçoes eleitorais, votavam num mesmo candidato – Putin.

Putin ganhou com cerca de 64% de votos. Na verdade ninguém sabe quantos ele ganhou, mas calcula-se que a fraude lhe garantiu uns 15 a 20% de votos adicionais, roubados principalmente de Gennadi Ziuganov (obteve um pouco mais de 17% de votos) do Partido Comunista. Por isso, Zyuganov não felicitou Putin pela vitória. E fez mais: chamou as eleições de desonestas, não transparentes e ilegítimas.

Segundo método: o medo

Não posso negar que o poder russo é astuto e competente no que se refere à sua sobrevivência e reprodução. Uma vez construída, por Putin, a vertical de poder, com a anulação de eleições de governadores regionais, a criação de um poderoso partido governante “domesticado” que transformou as outras organizações politicas em satélites dirigíveis e mais a opressão da oposição radical, o regime atual na Rússia tornou-se fascista, parecido com a Espanha de Franco e Portugal de Salazar.


Nessas condições, o medo e’ o melhor método para dirigir um povo dócil. Criou-se, assim, o medo de algum inimigo real ou inventado – para precisar de um salvador da pátria, um caudilho, um guia. Em 1992 e 1996, Yeltsin, para chegar ao poder, usou o medo do comunismo. A tevê intimidou o povo com cenas sangrentas de violência e homicídios praticados por comunistas. Naquela época, o anticomunismo deu certo, e os eleitores apostaram no salvador da pátria contra os “horrores” televisionados. A partir de 2000, o anticomunismo esgotou-se como método de medo. A troca de Yeltsin por Putin incluiu a explosão de edifícios em Moscou (os culpados foram, claro, os bandidos chechenos). A consequência foi uma guerra vitoriosa contra a Chechênia. Putin tornou-se o ídolo e salvador da Rússia.

O regime da Russia é suicida porque mata as suas proprias bases

Eis o mais interessante e paradoxal: que estratégia de medo usou o Kremlin nas ultimas eleições? O anticomunismo já não funciona porque a vasta maioria de cidadãos russos (como regra, vivem abaixo do nível de pobreza) está sonhando com a volta da União Soviética. Ao mesmo tempo, a Chechênia está sob controle. (A Chechênia está recebendo de Moscou billões de dólares de doação por ano, tem petróleo, tem suas próprias leis islâmicas diferentes das russas, etc. Quer dizer o Kremlin comprou o poder supremo da Chechênia).
Retorno de reformas como a Perestroika humilharia o país, diz Putin. Eleitora fica indecisa. Foto: Slava Alekseyev

Nessas circunstâncias, Putin teve de instilar novos medos: a volta da Perestroika e de reformas liberais. Às vésperas das eleições, o Kremlin disse ao povo que desta vez a Rússia (tal como a União Soviética) seria fragmentada e humilhada caso houvesse um retorno de reformas liberais dos anos 1990. O povo seria mais uma vez roubado e enganado por novos líderes liberais. O regime de Putin organizou uma série de grandiosos comícios e manifestações contra… o próprio regime, quer dizer, contra as fraudes nas eleições parlamentares de 4 de dezembro de 2011.

Os comícios, vale anotar, foram encabeçados precisamente por aqueles mesmo líderes liberais que o cidadão russo deveria ter medo no pleito presidencial. Até organizações patrióticas tiveram medo de retorno do liberalismo, da Perestroika, e votaram em massa no salvador, Putin. Vários ex-comunistas também sentiram-se intimidados com a volta dos anos 1990, e proclamaram Putin como o messias. A Igreja Ortodoxa russa, agora muito próxima do poder e do dinheiro do regime, conclamou seus fiéis a votar em Putin. Temiam perder suas riquezas acumuladas na época do salvador…


O medo de Perestroika e reformas liberais significa que a “serpente mordeu a sua cauda” e o círculo mágico fechou. Ou, como diziam os franceses, a “revolução devora os seus filhos”. Em outras palavras, daqui em diante o regime fascista do Kremlin vai entrar em agonia. Basta que os preços de petróleo fiquem abaixo de uns 60 dólares por barril para que na Rússia estoure uma “revolução de neve”. O conflito provocará mortes, e isso singificará a atual “estabilidade de cemitério.”

Por “estabilidade de cemitério entende-se o seguinte: a população russa sofre uma perda anua de em 1 milhão de habitantes por conta de homicídios. O quadro é caótica, como atestam outros números: 60% do povo vive abaixo do nível de pobreza; somos o primeiro lugar no mundo em viciados em heroína – morrem da overdose 70 mil jovens ao ano; a esperança média de vida dos homens é de 58 anos.

Creio que Putin teve uma vitória de Pirro e não conseguirá dirigirá o país durante o mandato de 6 anos. Ficará no poder de 2 a 3 anos.

Texto: Slava Alekseyev que é jornalista em Moscou

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